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terça-feira, 18 de maio de 2010

Por um Feng Shui Mais Artístico


Alberto Cabral - Filósofo e Espiritualista


Como arquiteto, faz parte da minha formação acadêmica uma busca pelo belo, ora no contexto construtivo em si (principalmente pela ótica modernista e suas variantes, dado o treinamento), ora pelo viés conceitual, o valor de uma idéia através do apuro técnico ou mesmo estético. Incluem-se nessa última a observação sensível da arte como um todo, seja a beleza de um quadro ou a profundidade de uma poesia.

Uma das últimas lembranças de como é importante a boa arte na sensibilização da alma surgiu durante um show de MPB. Cadeira e violão, como se pede João Gilberto, além da banda valorizando a voz que tocava algo a mais do que nossos ouvidos, ampliando sonoridades surpreendentes num salão de possibilidades, a aura em manifestação.

Abaixando-se ao entrar e ”batendo cabeça”, ato de agradecimento ao palco, aos integrantes, à platéia; a devoção, enfim, pela música. Mais do que a melodia vocal primorosa, tocou-me o espanto de se ver aplaudida em icônico local, muito maior e lotado do que os barzinhos de outrora. A voz embargada entre os agradecimentos, as lágrimas singelas em meio às canções...

Muitos disseram que a dita apresentação “lavou a alma”; no meu caso, além disso, diria que me fez relembrar a importância dessa sensibilização transpassada a outros ofícios mais duros e secos, incluindo aí o Feng Shui. Como poderíamos nos tornar mais sensíveis à arte do bom lugar, tratando as técnicas de maneira mais suave, como as melodias de Maria Gadú?

No artigo anterior, algumas considerações sobre o Feng Shui foram feitas, sobretudo num ponto em que alguns estudiosos do ramo tradicional podem não concordar: de que, na verdade, o Feng Shui Clássico não é uma ciência (pelo menos no âmago da palavra), mas sim técnicas que, no seu pacote final, mais se aproximam de uma visão artística. Obviamente, não se pretende aqui enquadrar o Kan Yu na mesma arte reconhecida num pintor ou escultor, mas sim averiguar a noção de visão sensível, ou seja, algo que engloba múltiplas possibilidades e estudos unidos por uma sabedoria, no caso, a chinesa.

Sentir as Montanhas e averiguar os seus pontos de força; compreender como o Qi “sopra”, manifestando-se no Tempo e Espaço, unindo as probabilidades energéticas ao cotidiano dos seres, que buscam, assim, uma expressão singular do Bem-Viver...

Assim, mesmo que haja uma metodologia inata, tanto nos textos cifrados quanto na aplicação, parece-me inquestionável a relação entre visão cognitiva (algo que se averigua além da simples percepção lógica dos cinco sentidos) e o Feng Shui. É a partir dessa diretriz sensível que coloco minha aversão ao Kan Yu contemporâneo de simples causa e efeito, sem a mínima mudança na postura pessoal (Ren Qi).

Mas como mudar essa tal postura? Provavelmente através do esforço, um refletir meditativo e atento que configura o Estar Presente, e por inteiro, nas carências e medos vivenciados no cotidiano. Não tentar meramente afastá-los com uma técnica mágica niilista, seja de Dragões de Água, Estrelas Voadoras ou mesmo de Qi Men Dun Jia. Usar os desafios para, como dizia Nietzsche, iniciar um processo de transvaloração dos valores, das certezas.

E quando seria possível vivenciar em totalidade os conflitos do Eterno Retorno, dada a complexidade desse cotidiano que nos afasta do viver pleno? Talvez nos momentos em que nossa guarda “abaixa”, seja pela dor ou na sensibilização d’alma. Pela Espiritualidade. Pela Arte, enfim.

Voltando ao show em questão, vi as similaridades da inocência sábia da cantora-musicista com a sensibilização que gostaria de ver no Feng Shui; naturalmente, não se nega a importância da técnica, do apuramento musical e das influências passadas, tal qual um consultor que utiliza a Luo Pan e estuda em profundidade as escolas e os mestres em questão. Não se nega também a prosperidade, o valor da abundância estimulada por uma boa consultoria, que consegue exaltar o que já estava lá em potencial, tal qual a satisfação do artista ao pisar num palco em “dia de casa cheia” e receber os aplausos merecidos. O que se jaz triste é a tentativa de transformar a ferramenta em solução, o método sensível em simulacros vazios e rígidos, de enquadrar o som lúdico em regras de sucesso.

Naturalmente, há muito a ser aprendido, mas antes, há muito a ser esvaziado...

Essa condição está além do mero jargão ser “mais” San-He (poético) do que San-Yuan (matemático, técnico); ou melhor, é anterior a dicotomia acima, pois se trata de algo vinculado à índole sob efeito do karma (e a contemplação desse fato como foice à maturidade). Por conseguinte, o Feng Shui, nessa ótica, seria uma das infinitas ferramentas que auxiliam na compreensão das experiências em meio à constante mutação das idéias e perspectivas.

Talvez nos falte exatamente o vivenciar dessa Presença, do Inusitado, da Surpresa, da Epifania em momentos de crise; talvez nos falte ensinar e aprender o Feng Shui de uma maneira mais artística; talvez nos falte apreciar, verdadeiramente, a sutil sonoridade que se exalta nos arranjos dos Ventos e das Águas...



Viviane Mosé (PHD) - Psicóloga, Filósofa e Poeta